quarta-feira, 17 de abril de 2019

17 de Abril as marcas de um massacre


Eldorado dos Carajás, quarta-feira, 17 de abril de 1996:
 19 trabalhadores sem-terra são assassinados pela 
Polícia Militar do Estado do Pará. Esse fato, ocorrido 
há 23 anos, tornou-se símbolo de luta e representação 
dos conflitos agrários que ainda hoje acontecem no campo 
brasileiro.

Meses antes de o massacre ocorrer, em setembro de 1995, 
cerca de 3.500 famílias montaram acampamento às margens 
da Rodovia PA-150, em Eldorado dos Carajás, sudeste do 
Pará. Próximos à Fazenda Macaxeira, os trabalhadores 
reivindicavam aquelas terras, consideradas pelo grupo como improdutivas.

Em 5 de março de 1996, a decisão foi de ocupar a fazenda. 
Com isso, começaram novas negociações com o 
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra
que conseguira um laudo, forjado, segundo os Sem-Terra, 
comprovando a produtividade da terra. 
Instituto de Terras do Estado do Pará fazia as mediações 
entre os trabalhadores rurais e o Incra para acelerar o processo 
de assentamento das famílias, ficando acordado o envio de 
alimentos e medicações para os camponeses.

Porém, o combinado não foi cumprido. Com o intuito de 
protestar contra a quebra da promessa, no dia 10 de abril, aproximadamente 1.500 famílias iniciaram uma marcha até a capital, Belém. Após sete dias de manifestação pedindo pela desapropriação da Fazenda, os trabalhadores e trabalhadoras 
decidiram bloquear um trecho da estrada conhecido como 
curva do S”. O objetivo era negociar alimentação e transporte 
básicos.

Sem diálogo com o grupo, Almir Gabriel (PSDB), governador 
do Pará na época, ordenou que a rodovia fosse desobstruída. 
Uma tropa com 155 policiais militares foi enviada, sob 
comando do coronel Mário Colares Pantoja e do major 
José Maria Pereira de Oliveira. Os policiais abriram fogo 
contra os agricultores, deixando 19 mortos e mais de 
60 feridos. Dois trabalhadores morreram dias depois. 
Entre os policiais, nenhuma vítima com ferimentos graves.

Entre todos os envolvidos e denunciados pelo massacre, 
apenas o coronel Pantoja e o major Oliveira foram 
condenados, a 228 e 154 anos de prisão, respectivamente. 
Todos os outros policiais foram absolvidos, e o 
ex-governador Almir Gabriel não chegou a ser denunciado.


Charge em homenagem ao massacre de Eldorado dos Carajás | Ilustração: Carlos Latuff

No local onde o massacre ocorreu, hoje está estabelecido 
Assentamento 17 de Abril. A maioria dos moradores são 
sobreviventes da chacina e familiares das vítimas. 
A data do massacre acabou sendo escolhida pela 
Via Campesina, organização internacional de camponeses, 
como o Dia Internacional de Luta pela Terra. Desde então, 
abril também é marcado como o mês em que são intensificadas 
as lutas por terras pelo Movimento Sem Terra. É, ainda, 
uma forma de camponeses e camponesas se unirem para 
lembrar a data e homenagear as vítimas do massacre.

Caminhos da Reforma Agrária

Este ano, as manifestações do “Abril Vermelho” que 
reivindicam a Reforma Agrária estão ocorrendo no 
contexto do governo de extrema direita de Jair Bolsonaro
O presidente chegou a suspender, depois retratar, até voltar 
a suspender por tempo indeterminado a reforma agrária
Por isso, o foco dos protestos atuais está em torno dessa paralisia.

Com a suspensão das vistorias de imóveis rurais, os 
processos de assentamentos ficam interrompidos, 
prejudicando as famílias que estão acampadas. 
A política nacional da Reforma Agrária, que busca realizar a desapropriação e redistribuição de terras, vem perdendo 
espaço no cenário econômico brasileiro há alguns anos. 
Em 2019, a Lei Orçamentária aprovou R$ 762 milhões de 
gastos para a área, que em 2015 eram de R$ 2,5 bilhões, 
segundo dados do Ministério do Planejamento.

O Brasil do massacre de Carajás

Em julho de 2018, ainda como pré-candidato à presidência, 
em visita a Eldorado dos CarajásBolsonaro declarou que
“quem tinha que estar preso era o pessoal do MST, gente 

canalha e vagabunda. Os policiais reagiram para não morrer”.

Segundo dados da Comissão Pastoral da Terra - CPT 
em um relatório que aponta os conflitos no campo no 
país em 2018, no ano que passou, 960.630 pessoas estiveram 
envolvidas em confrontos agrários, sendo que em 2017 
o número foi de 708.520 pessoas.

17 de abril de 1996 não foi a única data manchada de 
sangue na história do campo brasileiro. 23 anos depois, 
a história segue se repetindo. “Há uma nação de 
homens sem rosto, soterrado na lama, sem nome, 
soterrado pelo silêncio”, escreveu Pedro Tierra
poeta e político brasileiro, em seu poema 
A pedagogia dos Aços, que homenageia os 
mortos do massacre.

Ele se refere às 21 vítimas de Carajás: 
Abílio Alves Rabelo, Antônio Alves Rabelo, 
Altamiro Ricardo da Silva, Amãncio dos Santos Silva, 
Antônio Alves da Cruz, Antônio Costa Dias,
Graciano Olímpio de Souza, João Carneiro da Silva, 
João Pereira, João Rodrigues Araújo, 
Joaquim Pereira Veras, José Alves da Silva, 
José Pereira, José Ribamar Alves de Souza,
Leonardo Batista de Almeida, 
Lourival da Costa Santana, Manoel Gomes de Souza, 
Oziel Alves Pereira,Raimundo Lopes Pereira, 
Robson Vitor Sobrinho, Valdemir Ferreira da Silva.

“A terra vale um sonho? A terra vale infinitas reservas de 
crueldade, do lado de dentro da cerca. Hoje, o silêncio 
pesa como os olhos de uma criança depois da fuzilaria. 
Candelária, Carandiru, Corumbiara, Eldorado dos 
Carajás não cabem na frágil vazilha das palavras... 
Se calarmos, as pedras gritarão...”, conclui Tierra.

Fonte: Carta Maior

17 de abril: as marcas de um massacre - Carta Maior

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